segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Entrevista com o escritor Ricardo Azevedo


Folha de Londrina
Caderno Folha Cidadania
Carina Paccola
4 de março de 2001


1 Quando percebeu que iria ser escritor e ilustrador de histórias infantis?
Escrevo desde a adolescência e tive, no tempo da escola, um incentivo grande por partes de professores que gostavam dos meus textos e até, de vez em quando, liam minhas redações em outras classes. Isso, claro, foi importante para mim. Escrevi meu primeiro texto para crianças com uns 17 anos. Chamava-se "Um autor de contos para crianças" que mais tarde, treze anos depois de escrito, foi publicado com o título de "Um homem no sótão" (Ática). É preciso dizer que meu pai, Aroldo de Azevedo, era professor de Geografia na Universidade de São Paulo e autor de muitos livros didáticos. Dessa forma, o assunto livros, criação de livros, textos, publicações e editoras faz parte da minha vida desde que me lembro por gente. Por outro lado, desenho desde pequeno, aliás, como quase todo o mundo. Quando escrevi meu primeiro texto para crianças, ainda moleque, sonhei que um dia, talvez pudesse fazer um livro com texto e imagens minhas.


2 Você gosta mais de escrever ou de desenhar?
Escrever e desenhar são duas formas de expressão, ambas riquíssimas, cada qual com suas peculiaridades. Às vezes, quando estou escrevendo, penso: isso não vou detalhar pois o desenho vai dar conta melhor. Outras vezes penso: é preciso trabalhar bem tal cena pois ela é essencialmente literária e não pode nem deve ser desenhada. Faço sempre o texto primeiro; os desenhos vêm depois. Quando estou escrevendo surgem idéias visuais e imagens. Nuncas as aproveito pois são fracas e óbvias. Só depois, quando o texto está pronto e, num certo sentido, estou livre dele, é que consigo trabalhar com as imagens. Dizem que texto e imagem correspondem a diferentes partes do cérebro. Acho que são mesmo.


3 O que é mais importante no livro infantil: o texto ou o desenho?
É preciso diferenciar um pouco as coisas. Para crianças que ainda não sabem ler, as ilustrações são um recurso importante pois ajudam o leitor a compreender o que está lendo. Acontece que com sete, oito anos, a maioria das criancas já domina a leitura. A partir daí, surgem novas alternativas: há livros sem texto, só com imagens. Há livros onde texto e imagem se complementam de forma indissoluvel. Há também textos que independem de ilustração e mesmo assim são ilustrados. Cada caso tem seu interesse e suas peculiaridades. Para mim, desde de que a crianca já saiba ler, o que importa é que as ilustrações não sejam redundantes dizendo o que o texto já disse mas, ao contrário, que tragam novas informações , ampliando o universo significativo do texto.


4 Hoje é mais fácil ser autor de livro infantil do que quando você começou? Por quê?
Acho que existem fases. No meu caso, em 1980, época em que lancei meu primeiro livro, muitas editoras estavam procurando novos autores. Portanto, tive sorte. Depois, por causa das crises economicas, houve momentos em que as coisas ficaram mais difíceis. Tenho a impressão de que hoje, neste momento, a situação é favorável aos novos autores. Agora é preciso ser claro: trabalhar com livros num país como o Brasil, com tantos analfabetos e tantas pessoas que sabem ler mas não são leitores, é sempre uma luta.


5 Soube que você tem um projeto com livros que não são comercializados.
Sim, trata-se do projeto Fura-bolo. Sou autor de 8 livros de literatura infantil, muito bem produzidos pela Cargill, ilustrados pela Mariana Massarani, Eva Furnari, Alcy Linares e por mim. Esses livros são distribuídos gratuitamente e utilizados em escolas de comunidades pobres, com crianças sem acesso a livros de ficção e de poesia. Para que a coisa funcione, a Cargill ainda dá uma capacitação, feita pelas educadoras Candu Marques e Lú Mendes, aos professores que vão trabalhar com os livros. Hoje já são mais de setenta mil crianças envolvidas, em municípios espalhados por todo o Brasil. É um projeto maravilhoso, social e cultural, que realmente ajuda a formar leitores e do qual eu, e todos que dele participam, nos orgulhamos muito.


6 Por que resolveu escrever sobre folclore para crianças?
Tenho feito uma pesquisa com contos de encantamento e outras formas populares há quase vinte anos. Na minha visão, a literatura infantil é muito mais uma literatura popular do que qualquer outra coisa. Ou seja, ela quase sempre trata de assuntos que interessam e emocionam a todos, numa linguagem clara, direta e concisa. Outra coisa: os contos de encantamento, os contos de fadas, sempre interessaram e foram contados para todas as pessoas, independentemente de faixas etárias. Com a boa literatura para crianças, a meu ver, ocorre o mesmo.

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